O País tem assistido ao abandono frequente do Serviço Nacional de Saúde (SNS) por parte de diversos médicos especialistas, não apenas devido à baixa remuneração e à elevada burocracia, mas também pelas más condições de trabalho que enfrentam. Particularmente nos serviços de urgência, os médicos têm sido expostos a situações de extrema insegurança.
As maternidades, em especial, têm sido foco de atenção devido à sua relevância e particularidades. O encerramento temporário de várias unidades tem-se tornado frequente por falta de recursos médicos, e muitas equipas estão a trabalhar em condições incompatíveis com os padrões de qualidade e segurança exigidos para o exercício desta especialidade. Em resposta, a tutela tem procurado adaptar-se às insuficiências através da organização de modelos regionais de encerramentos programados.
Contudo, a situação atingiu um ponto em que o que deveria ser raro se tornou norma. Com a contínua degradação das condições de trabalho, cada vez mais especialistas estão a abandonar os serviços de urgência ou o próprio SNS. Nas zonas críticas, nem mesmo os períodos de abertura previamente definidos conseguem ser garantidos, pois as equipas estão no limite de exaustão, entre desgaste acumulado e burnout.
A solução proposta? Um passo para trás!
Frente a esta crise, qual é a solução encontrada pelo Ministério? Pela Direção Executiva? E pela Ordem dos Médicos? Melhorar as condições de trabalho? Tornar o SNS mais atrativo para fixar os especialistas existentes e captar novos profissionais ou até recuperar os que saíram? Infelizmente, não.
O que se tem observado é a perpetuação de uma abordagem que, ao longo do tempo, tem revelado fragilidades. A opção tem sido nivelar por baixo as condições de segurança e a qualidade das equipas médicas, impondo aquilo que, até recentemente, seria considerado inaceitável para o exercício da Ginecologia e Obstetrícia. O que antes era visto como um padrão mínimo, agora é encarado como normal. A normalização da mediocridade, portanto.
No mês de agosto, de forma discreta e sem consulta pública, foi aparentemente alterado o disposto no Regulamento da Constituição das Equipas Médicas nos Serviços de Urgência relativamente à Ginecologia/Obstetrícia. Este regulamento, publicado no Diário da República, tinha como objetivo garantir condições mínimas de funcionamento para as equipas médicas. No entanto, as novas regras apresentadas alteram esse quadro, sem qualquer contraditório ou consulta pública, desvalorizando a saúde e segurança das grávidas e dos próprios médicos.
A mera referência à necessidade de um Cirurgião Geral para justificar condições num Serviço de Urgência de Ginecologia/Obstetrícia é desde logo absolutamente inaceitável.
Um risco para a segurança de todos
O SIM manifesta enorme preocupação com a adoção destas medidas e compromisso da segurança das grávidas e demais utentes, assim como a dos médicos da especialidade de Ginecologia/Obstetrícia. Embora os defensores dessas novas diretrizes argumentem que se aplicam apenas a "situações excecionais", a realidade tem demonstrado que essas exceções são muitíssimo frequentes, tornando-se portanto a nova norma.
Esta decisão enviada pelo Ministério da Saúde às administrações mas, aparentemente, congeminada algures por outrem, agrava muitíssimo as já difíceis condições de trabalho dos médicos nas urgências.
A pergunta que fica é: quem assume o impacto desta nova realidade? A resposta sabemos à partida: não vão ser os criadores destes regulamentos, nem os administradores que ordenarem a abertura das urgências nestes moldes mas sim o único médico Ginecologista/Obstetra que estará sozinho a dar a cara numa urgência aberta.
Em vez de melhorar as condições para os médicos que com muito esforço pessoal e familiar têm suportado esta situação já difícil, observa-se um agravamento das circunstâncias.
Esta é mais uma razão para aumentar a saída dos médicos que ainda se mantêm a trabalhar no SNS e que fazem ainda trabalho de urgência nas maternidades.