Sol, 14 março 2023, Maria Moreira Rato
Há um ano fora do Serviço Nacional de Saúde (SNS), Pedro Figueiredo, de 40 anos, de Leiria, respira de alívio. "Andamos todos a roçar no burnout e quando alguém entra em burnout, deixa de se preocupar”.
"Sentia-me completamente subvalorizado no SNS. Temos uma formação excelente, a nível de faculdade e especialidade, por isso é que querem contratar-nos noutros países”, desabafa.
"Eu e a minha esposa estivemos para sair do país. Se não fossem as nossas filhas, faríamos parte das estatísticas. Todos os anos, pessoas emigram e não têm intenção de voltar e vai sair muita gente até 2025. Estamos muito envelhecidos e, a certa altura, o sistema vai colapsar. Um não serve para tapar os buracos todos. A não ser que tudo mude, que haja uma grande volta no SNS, não me imagino a regressar”.
Quem concorda com Pedro é Mara Marques, de 37 anos, das Caldas da Rainha, que decidiu rescindir contrato com o SNS em agosto de 2021. "Aquilo que acontece muito no SNS é que os médicos estão assoberbados com trabalho. O número de horas de trabalho não é suficiente para dar resposta a tudo aquilo que surge. Isso gera muita ansiedade e imensos casos de burnout”.
"Os médicos de família têm listas de doentes enormes, muito maiores do que era desejável, e são os responsáveis máximos pelos doentes”.
"No meu caso, aquilo que senti foi que o SNS não me permitia ser a médica de família que queria ser. Tenho brio, quero dar o meu melhor aos doentes e não conseguia fazê-lo em 15 minutos de consulta cronometrados. E é isto que faz muitos colegas abandonarem o SNS.
"Tivemos uma pandemia em que foram feitas horas extraordinárias. Os médicos já vinham de trás completamente desmotivados e com muitas horas extra, sem tempo para a família nem para eles mesmos. Passou a pandemia e, na realidade, nada mudou. Cada vez mais se veem médicos deprimidos, exaustos e sem vontade de nada”, narra Maria João Tiago, assistente graduada na USF São João da Talha, em Loures.