Na qualidade de médicos assistentes hospitalares e chefes de equipa de cirurgia geral a exercer funções no Departamento de Cirurgia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN), vimos por este meio prestar esclarecimentos sobre as posições por nós assumidas nas últimas semanas, nomeadamente a indisponibilidade para realização de horas extraordinárias, demissão dos cargos de chefia de equipas de urgência, e invocação de exclusão de responsabilidade disciplinar face ao funcionamento anómalo do Serviço de Urgência Central.
Atualmente, como cirurgiões gerais do CHULN, pertencemos a equipas altamente especializadas e com elevado grau de diferenciação. Integramos ainda o quadro de assistentes e docentes da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. Desenvolvemos atividade assistencial (Internamento, Consulta externa, Apoio aos Serviços, Urgência Interna, Bloco Operatório, Reuniões Multidisciplinares), e somos ainda responsáveis pela formação dos médicos internos do complementar, da especialidade e dos estudantes da faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.
A organização do Serviço de Urgência Central do CHULN, rege-se por circuitos de referenciação interna e protocolos de actuação desatualizados que obrigam os Cirurgiões a ser responsáveis por situações clínicas para as quais não tiveram formação e que contornam as competências reconhecidas pelo Colégio da Especialidade, muitas não urgentes ou fora do pressuposto da nossa área de atuação, e em condições que violam o âmbito da nossa intervenção em contexto de centro hospitalar de nível III, contribuindo para a exaustão de uma equipa já fragilizada e subdimensionada.
O número deficitário de elementos de cada equipa obriga à prática de um horário extraordinário permanente, ultrapassando largamente os limites previstos por lei, colocando em causa a qualidade e segurança dos cuidados prestados à população, quer em contexto de urgência, quer em contexto eletivo.
Em resumo, a degradação das condições de trabalho no Serviço de Urgência externa, nomeadamente o número excessivo de horas extraordinárias, equipas subdimensionadas para o trabalho prestado, realização de trabalho fora do âmbito da nossa especialidade, compromete uma adequada e segura prestação de cuidados de saúde aos doentes na urgência, compromete a atividade assistencial não urgente, a formação contínua dos médicos do Departamento de Cirurgia, com exaustão do presente quadro clínico do Serviço.
Esta situação, há muito previsível, foi continuadamente reportada ao longo dos anos, seguindo a hierarquia institucional, sem que tenham sido concretizadas respostas com impacto na prática clínica, por parte da tutela.
Assim:
a. No dia 21 de Outubro de 2021, os assistentes hospitalares informaram formalmente a Direcção de Departamento e a Direção Clínica da sua indisponibilidade para continuar a fazer horas extraordinárias, para além das previstas por lei, e já em muito ultrapassadas nesta data, nas condições antes referidas.
b. Os chefes de equipa de cirurgia, no dia 10 de Novembro de 2021, solidários com as questões levantadas, e na ausência de qualquer resposta por parte da Direção Clínica, apresentaram a demissão do seu cargo.
c. No dia 22 de novembro os chefes de equipa formalizaram a demissão do cargo de chefia, pediram recusa de horas extraordinárias e pedido de dispensa de obrigação de prestar Serviço de Urgência, ao abrigo da legislação em vigor, por ter sido ultrapassado o limite de idade.
d. No dia 24 de novembro de 2021 e perante a manutenção dos problemas identificados, também os Internos de formação específica decidiram recusar a realização de horas extraordinárias.
e. À data, decorreram diversas reuniões com os órgãos de administração hospitalar, verificando-se que a maior parte das questões por nós expostas continuam sem resolução. Tendo em conta o acima exposto, a partir do mês de dezembro de 2021, não estão assegurados critérios para constituição de equipas de Urgência Externa no CHULN que garantam o atendimento dos doentes sem risco de ofensa directa à legis artis e sem produção, embora involuntária, de eventuais danos aos doentes a cargo desta instituição.
Lisboa, 30 de novembro de 2021
Chefes de equipa de urgência, assistentes hospitalares e internos da formação específica da especialidade de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia do CHULN